Muitos pais e educadores utilizam a literatura infantojuvenil como uma poderosa ferramenta para abordar temas fundamentais da vida, como sonhos, morte, política e sentimentos. Os livros também oferecem uma oportunidade valiosa para iniciar conversas com as crianças sobre um aspecto essencial: o significado de ser uma família.

Isso nos leva a reflexões importantes, como: “O que torna um grupo de pessoas uma família?”. Antes de ensinar às crianças a importância de respeitar os diferentes formatos familiares — que são muitos e diversos —, é essencial que os adultos reflitam e elaborem sobre essas questões. Só assim poderão dialogar com os pequenos de forma honesta e aberta.

diversidade familiar
Foto: Canva

Recentemente, pesquisadoras da Universidade Católica do Salvador e da Universidade de Brasília buscaram analisar o ponto de vista de pré-adolescentes sobre formatos diversos de famílias. O estudo “Diferentes Arranjos Familiares na Perspectiva de Pré-Adolescentes”, publicado em julho de 2024 na revista científica Scimago Institutions Rankings, analisou a opinião de 40 indivíduos entre 11 e 14 anos de idade sobre quatro modelos familiares: nuclear, monoparental, recasada e extensa.

Ao se depararem com o modelo tradicional de família, a maioria das crianças atribuiu a ele adjetivos positivos ou, pelo menos, neutros. O mesmo ocorreu para as famílias extensas. No entanto, quando as pesquisadoras apresentaram famílias monoparentais e recasadas, a maior parte das atribuições foram negativas, com respostas como “família incompleta”, “não perfeita” e “não harmônica”.

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como livros sobre diversidade familiar ajudam na formação das crianças

Para Mari Muradas, educadora feldenkrais* e doula de parto e adoção, trabalhar com literatura infantil é um jeito maravilhoso de não só plantar sementes em cada criança sobre o respeito à diversidade, mas atingir também os adultos que fazem a mediação da leitura, como pais e professores.

Mari fundou em 2019, ao lado de Mayra Aiello, o Instituto Doulas de Adoção Brasil, com o objetivo de prestar apoio completo às famílias em quaisquer etapas do processo de adoção. “Eu estou sempre indicando livros e filmes em nosso trabalho. Eu utilizo uma curadoria de materiais para as famílias lerem em casa e até mesmo para elas indicarem para familiares e outros conhecidos, porque às vezes essas pessoas próximas ainda não foram expostas a reflexões do tipo”, conta.

“Nos últimos anos, tenho visto mais títulos bons para indicar [sobre o tema da adoção], mas o que são dois ou três livros em uma biblioteca gigantesca? Eu falo que a gente está celebrando o micro para não desanimar (…),  mas ainda falta fazer com que esses livros não cheguem só nas famílias lidas como diversas, mas para todo mundo.” – Mari Muradas, educadora

Mari diz que é muito comum que as famílias que passam pelo Doulas de Adoção sintam falta de referências diversas de agrupamentos familiares. Foi inclusive por conta da escassez de boas obras com famílias adotadas que a educadora decidiu escrever sua própria obra infantil Filho é Filho (2020). “A intenção do livro era ler para o meu filho, que é exclusivamente biológico, para que ele soubesse respeitar, desde sempre, os amigos dele que fossem como sua mãe e avó, adotadas. Eu quero contar a minha história para ele com naturalidade”, diz a autora.

Há ainda outro ponto que Mari defende na hora de retratar famílias de todos os tipos na literatura: não associá-las sempre a dores e exclusão que possam sofrer por serem diferentes. Retratar, por exemplo, as dificuldades que uma mãe-solo enfrenta ao criar os filhos é essencial, mas esse não precisa ser o foco de todas as histórias que envolvam essas personagens. Para Mari, é preciso que escritoras(es) tenham criatividade para criar histórias de todos os gêneros envolvendo perfis variados. Imagina um livro de aventura no espaço com uma família monoparental?

diversidade familiar
Foto: Canva

Foi inclusive em busca dessa leitura diversa que o comitê escolar de pais e mães de que Mari faz parte decidiu montar uma biblioteca comunitária sobre diversidade na escola de seu filho. Eles elaboraram cuidadosamente uma curadoria de cinquenta livros para que, a cada semana, os estudantes levassem uma das obras para ler em casa.

“Nas obras escolhidas, há, por exemplo, a diversidade racial e étnica, como também o protagonismo de Pessoas com Deficiência (PcD) e de famílias diversas.” O projeto está indo para seu terceiro ano e, na opinião de Mari, foi um sucesso não só entre as crianças, mas também para as famílias que leram esses livros em casa com seus filhos.

“Eu sou convidada para fazer a leitura do meu livro nas escolas e esses convites geralmente chegam quando algo já deu ruim, né? Muitas vezes, porque uma criança falou algo desrespeitoso para a outra. E aí eu fico muito impactada de ver como crianças de 5/6 anos já estão reproduzindo falas completamente violentas e equivocadas sobre a adoção.” – Mari Muradas, educadora

*Método Feldenkrais: processo de aprendizado que busca, por meio da consciência corporal, melhorar a saúde, bem-estar e em todas as áreas da vida do indivíduo.

POR MAIS Livros infantis com diversidade familiar

Escutar e ler histórias é uma das maneiras mais simples e divertidas que temos para descobrir a existência de diferentes realidades. Quando alguém só consome narrativas de um determinado perfil, acaba muitas vezes normalizando apenas esse tipo de existência e estranhando (ou até mesmo desrespeitando) quem não se encaixa. Por isso é importante que crianças leiam livros com famílias de todos os tipos. Não só para que os filhos dessas famílias não-normativas se identifiquem, mas também para promover o respeito e aceitação de todas as pessoas.

Em seu livro Lá em casa somos – já entregue pelo Clube Quindim aos assinantes – a escritora Isabel Minhós Martins e a ilustradora Madalena Matoso brincam com diferentes cálculos matemáticos para descrever a família central do livro, com trechos como “Lá em casa, somos 78 dedos, 20 dedinhos e 20 dedões…”

Ao ler o livro, as crianças podem perceber que não há uma receita exclusiva para uma família: ela pode ter diferentes quantidades de mãos, cabeças e olhos. “[É importante ter a representatividade de famílias diversas nas histórias], o máximo possível. Neste livro, podemos ter alguns elementos mais clássicos da família (mãe, pai e avô) mas o final remete muito para a ideia de família alargada. A casa abre-se ao mundo, à festa, aos primos que chegam, aos amigos”, conta Isabel.

Por que ler livros sobre diversidade familiar e importante para as criancas. Imagem do livro La em casa somos
Imagem do livro “Lá em casa somos“, de Isabel Minhós Martins e Madalena Matoso. Crédito: Clube Quindim

“A ilustração contribui muito para esta representação de diversidade. Temos [no livro] personagens de todos os tipos, gêneros e cores! Diversidade etária também.” – Isabel Minhós Martins, autora

Veja também: 8 livros sobre diversidade para ler em família

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9 livros com diversidade familiar selecionados pelo QUindim

Agora que você já entende a importância, veja abaixo outros livros do catálogo do Clube Quindim que trazem, entre seus personagens, diferentes formatos familiares:

Capa Frente Famiias transparente e1735311123865
Escritor: Ilan Brenman
Ilustrador: Guilherme Karsten
Editora: Moderna
Faixa etária: 0 a 8 anos

1. Famílias

Cada família tem as suas particularidades. Este imaginário deixa claro que não há um padrão a ser seguido e que existe riqueza na diversidade.

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Autora: Catarina Sobral
Editora: WMF Martins Fontes
Faixa etária: 0 a 8 anos

2. O meu avô

A delicada relação de um menino com o seu avô, contada sob a ótica da passagem do tempo cotidiano e dos entrecruzamentos com o vizinho de apartamento, Dr. Sebastião, o homem que está sempre a ver as horas e não tem tempo a perder.

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Escritora: Cristiana Gomes
Ilustrador: Odilon Moraes
Editora: Caixote
Faixa etária: 0 a 5 anos

3. O pai da Mamãe

Um dia de praia com o vovô: divertido e também revelador para uma garotinha. Entre uma brincadeira e outra, lembranças, novos-velhos hábitos e um amor que se reafirma.

A quatro mãos (autora Marilda Castanha, editora Companhia das Letrinhas)
Autora: Marilda Castanha
Editora: Companhia das Letrinhas
Faixa etária: 0 a 9 anos

4. A quatro mãos

Uma história sobre a jornada da vida acompanhada de mãos seguras, carinhosas e criativas. Prepare os lencinhos, revisite a infância e saúde aqueles que estão sempre ao seu lado.

Porcolino e mamãe (escritora Margaret Wild, ilustrações Stephen Michael King, editora Brinque-book)
Escritora: Margaret Wild
Ilustrador: Stephen Michael King
Editora: Brinque-Book
Faixa etária: 0 a 2 anos

5. Porcolino e Mamãe

Porcolino perdeu sua mãe ou perdeu-se dela? Será que a todo instante mãe e filho devem viver grudados ou há intervalos para exercitarmos nosso quinhão de individualidade e confiança?

Capa Frente Cara legal transparente e1735311829102
Autor: Keith Negley
Editora: VR Vergara & Ribas
Faixa etária: 0 a 9 anos

6. Meu pai era um cara legal

Um menino conta (ou imagina?) como era a vida do pai antes de ele ser pai — até que era um cara legal. Mas por que será que deixou de fazer tantas coisas de que gostava?

Capa Frente Familia mobilia transparente e1735312100976
Autora: Tatiana Blass
Editora: SESI-SP
Faixa etária: 0 a 8 anos

7. A Família Mobília

A família mobília é uma família de… móveis! Nesta história nonsense, a casa é uma bagunça, ninguém fica parado no lugar e cada um tem uma personalidade bem particular.

Capa Frente Mas papai transparente e1735312129275
Autores: Marianne Dubuc e Mathieu Lavoie
Editora: Jujuba
Faixa etária: 0 a 5 anos

8. Mas papai…

É chegada a hora de o Papai Gorila colocar os macaquinhos para dormir e está tudo pronto para o soninho. Será? Uma obra que retrata com muito humor os desafios de pais e filhos para este momento noturno.

Capa Frente Guarda chuva vovo transparente e1735312152248
Escritora: Carolina Moreyra
Ilustrador: Odilon Moraes
Editora: DCL Difusão Cultural do Livro
Faixa etária: 0 a 5 anos

9. O guarda-chuva do vovô

Uma garota questiona os motivos de seu avô nunca sair do quarto. Deseja estar mais próxima a ele, mas não é possível. Só mesmo um velho guarda-chuva para trazê-lo a sua companhia.

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