O preço dos livros muitas vezes é um tema que suscita paixões e debates acalorados. Há quem acredite que o livro é caro no Brasil e que o preço aumenta a cada ano. Mas será verdade? O que dizem os dados?

A renda familiar, a percepção de valor e as prioridades do consumidor influenciam na sensação de que o livro é caro no Brasil. Neste artigo, vamos desbravar esse assunto, desmistificando o preço dos livros e argumentando que, ao contrário do senso comum, ele tem estado estagnado nos últimos anos e não é, de fato, tão alto quanto pode parecer. Entenda mais a seguir!

O livro e caro no Brasil

O que compõe o preço dos livros?

Antes de discutirmos se o livro é caro ou não, é crucial entender como seu preço é composto. Um livro não se limita apenas ao custo de produção física. Não é só o custo gráfico que está em jogo. É uma cadeia complexa que envolve muitos profissionais: autores, ilustradores, editores, revisores, preparadores, tradutores, diagramadores, capistas, bibliotecários, distribuidores etc. Todos precisam ser remunerados e bem remunerados, de preferência. Tudo isso, claro, impacta no preço final do livro. A impressão em si é só parte dos custos e, em muitos casos, nem é a principal fatia nesse bolo que é a composição do preço do livro.

E, para o livro chegar ao leitor, vai mais um bocado de profissionais! Se o livro vai para uma livraria, a livraria terá que pagar os seus custos operacionais, os salários dos livreiros, a energia elétrica, a manutenção da loja etc. Se o livro é enviado pelo Clube Quindim, o clube terá que arcar com o time de atendimento, com o pessoal do marketing, com a turma da logística, com o frete etc. Tudo isso custa e não é pouco.

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Livro é Caro para uns, barato para outros: o que dizem os dados

Ao discutir o preço dos livros, é importante destacar que a percepção de algo como “caro” ou “barato” está profundamente enraizada na subjetividade. Muitas vezes, o que é caro para uma pessoa parece barato para outra. Com o livro não é diferente.

No Brasil, de acordo com dados do Painel do Varejo de Livros no Brasil, o preço médio de um livro ao consumidor era de R$ 44,56 em dezembro de 2023. Há, portanto, livros mais caros e mais baratos que isso, mas esta é a média.

Esse valor – R$ 44,56 – pode ser caro para uns e barato para outros. Vai depender muito de quanto essa pessoa ganha. Preço (ou a sua percepção) e renda andam juntos. Não tem como separar um do outro. De acordo com estimativas do Ipea, a renda média do brasileiro era de R$ 3.034 no fim de 2023. Considerando as duas médias, a do livro e a do rendimento, um livro “comeria” 1,46% da renda de um brasileiro comum.

E aí está o perigo das médias. Para um brasileiro que ganhava um salário-mínimo em 2023, um livro equivaleria a 3,35% do seu salário, mais do que o dobro do brasileiro médio. Comparativamente, para esse extrato da população brasileira, um livro custaria mais do que o dobro do que custaria para o “brasileiro médio”. O livro ficou mais caro!

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O livro é caro no Brasil? na verdade, o preço está estagnado

Até aqui, já entendemos como o preço do livro é composto. Entendemos também que a percepção do preço, e consequentemente se o livro é caro, varia conforme a renda. Um livro é mais caro para um brasileiro que ganha um salário-mínimo do que para um “brasileiro médio”.

Agora, a gente precisa entender como o preço do livro variou ao longo dos tempos. Em 2016, quando o Clube Quindim foi lançado ao público, o preço médio do livro ao consumidor era de R$ 37,26. O IBGE entra na jogada aqui para nos ajudar a entender as coisas, através da sua calculadora de inflação. Colocando lá o preço médio do livro em 2016 e pedindo para ela aplicar o índice de inflação no período, temos que o custava R$ 37,26 em dezembro de 2016 custaria R$ 53 em dezembro de 2023. Neste período, a inflação foi de 42,25%, segundo o IPCA.

No entanto, se a gente relembrar o que já falamos logo acima, o preço médio do livro ao fim de 2023 era de R$ 44,56. Ou seja, o preço do livro sequer foi corrigido conforme a inflação!

O livro e caro no Brasil 3

Livro, cinema e a indústria da atenção

É muito comum ler ou ouvir análises sobre o preço do livro no Brasil e compará-lo ao valor de uma ida ao cinema. Pode ser uma boa investigação. Uma ida ao cinema (quase) nunca é só uma ida ao cinema.

Se a pessoa tem carro, terá que pagar o estacionamento e se o cinema está dentro de um shopping, você já sabe. Se der fome, vai mais um balde de pipoca e quem sabe um refrigerante. Nada nada, a preços de hoje, uma pessoa sozinha, indo de carro a um cinema de shopping e comendo uma pipoca com refrigerante sai por algo em torno de R$ 85. Diversão garantida – e deliciosa – que vai durar algumas poucas horas. E você volta para casa sem poder emprestar ou rever – sem ter que pagar novo ingresso – aquele filme. Comparando com o preço médio de um livro (e a depender da renda de quem analisa), ir ao cinema é caro.

Mas o fato é que mesmo o valor do ingresso do cinema está defasado. É uma indústria que tem sofrido (muito mais do que o livro) com a digitalização da vida (quantos filmes você assistiu no cinema e quantos assistiu em suas plataformas de streaming nos últimos seis meses?). A concorrência é absurda. Talvez por isso, os cinemas também não reajustaram seus preços.

Uma busca rápida no arquivo da Folha de S.Paulo e você verá que o ingresso para uma sessão no Espaço Itaú de Cinema custava R$ 26 em 2016, mesmo ano de nascimento do Quindim. Hoje, neste mesmo cinema, o preço do ingresso durante a semana é R$ 32. Consultando a calculadora de inflação do IBGE, o valor deveria ser R$ 37, se reajustado conforme o IPCA.

Aí a gente entra no campo da demanda – ou a falta dela. Os mercados – e, consequentemente os preços – são regulados pela lei da oferta e da procura. Se tem mais gente assistindo filmes em casa em vez de ir ao cinema, os donos dos cinemas não podem subir o preço porque isso afastaria ainda um número maior de espectadores. Então, eles cortam na própria carne, mantendo os preços dos ingressos mais baixo do que deveriam, na fé de aumentarem o número de pessoas nas plateias.

Com o livro não é diferente. De acordo com a pesquisa Retratos da Leitura, que faz um perfil do leitor brasileiro, entre 2015 e 2019, o Brasil perdeu 4,5 milhões de leitores. E perdeu pra quê? Muitos dos respondentes da pesquisa apontaram que usaram mais do seu tempo acompanhando redes sociais, plataformas de streaming ou batendo-papo em aplicativos de mensagens instantâneas.

O livro, o cinema – e podemos elencar aqui toda sorte de entretenimento – mais do que indústrias criativas são indústrias da atenção. Cada uma puxa pra si a atenção do leitor ou do espectador. A concorrência, portanto, não é entre diferentes redes de cinema, ou entre redes de livrarias, serviços de clubes de leitura, ou até mesmo marcas de brinquedos. Todos esses atores lutam pela atenção e pelo tempo do cidadão que pode se dar ao luxo a um entretenimento, seja ele o cinema, o livro, o teatro ou até mesmo a TV gratuita.

Os livros precisam ser acessíveis e com qualidade

Como se vê, o tema “livro é caro” é multifacetado, permeado por muitas variáveis, que vão muito além do simples valor monetário. Compreender isso é um ato de civilidade, já que livros são marcos civilizatórios, ainda mais para as infâncias.

É vital que a gente discuta o preço e se o livro é caro, mas tendo em mente:

  • o que custa para se produzir um livro;
  • que o preço do livro sequer acompanhou a inflação nos últimos anos;
  • que percepção de preço de qualquer coisa, inclusive do livro, varia conforme a renda;
  • que há uma demanda decrescente pelo livro, com menos leitores.

Por fim, é preciso defender que o livro no Brasil não pode ser mais caro do que é. Ao contrário, ele precisa ser acessível, estar acessível, mas também precisa ter qualidade. Para ter qualidade, as editoras precisam investir e investir implica em preço. Como desatar este nó? Essa é a pergunta que fica para a reflexão.