A guerra entre Israel e o grupo Hamas, que já deixou mais de 11 mil mortes e se arrasta por mais de um mês, está por todas as partes: em todos os canais de TV, nos jornais, em todas as redes sociais e nas conversas. Por isso, nada mais natural que as crianças demonstrem interesse sobre o assunto, perguntando sobre os motivos que levaram ao conflito ou manifestando medo de que algo parecido aconteça perto delas. Mas como falar sobre um tema tão grave com os pequenos?

Especialistas e psicólogos concordam: o ideal é que os pais, cuidadores e educadores respondam sempre com sinceridade, e focando nas lições que a criança pode tirar dessa situação tão grave — e não nos horrores do conflito. E eles não devem se precipitar: não adianta forçar a exposição ao tema, especialmente entre crianças com menos de 7 anos, sem que ela tenha demonstrado que quer saber mais sobre o assunto. Espere a criança abordar o tema para só então iniciar a conversa e, caso ela manifeste interesse, mostre-se aberto e seja franco. Não transforme a questão em um tabu.

Como falar sobre a guerra sem deixar as criancas com ainda mais medo meio 1

“O ideal é que a gente deixe a própria criança ir guiando a conversa, deixar ela ir fazendo as perguntas, para entendermos até onde ela já sabe daquele assunto e por que está perguntando sobre isso”, afirma a psicóloga materna e educadora parental Érika Emil. “Nossa resposta deve ser a mais sucinta possível, para não expandir tanto a conversa em um tema tão delicado.” 

A psicóloga diz que também é importante não “abrir caixinhas de curiosidades” na cabeça das crianças. Num primeiro momento, responda com honestidade, mas sem detalhes e com uma linguagem apropriada à idade. Depois, tente entender o quanto ela já ouviu ou viu sobre a guerra e como se sente em relação a isso

Vale lembrar que nem todas as crianças vão se sentir afetadas pelas informações sobre um conflito de grandes proporções, o que também é natural, e não se deve forçar que elas pensem sobre esse assunto já na infância se não tiverem demonstrado vontade de conversar.

“Devemos nos ater a responder exatamente o que for perguntado, e evitar entrar em profundidade ou falar sobre vários pontos da guerra, especialmente do terror, que pode gerar mais medo e dúvidas na criança. Por exemplo, é bom evitar citar estatísticas sobre o número de vítimas ou colocar rótulos na guerra, como: esse lado é bom e esse é mau. A gente sabe que em um conflito sempre existem inocentes e vítimas dos dois lados”, pontua a educadora parental.

Veja também: 12 livros infantis para falar sobre morte, separação e outros temas difíceis.

Exposição de imagens de violência

Imagens e vídeos do conflito, fortíssimos, devem ser evitadas a todo custo pelas crianças, concordam os especialistas, já que podem aumentar os sentimentos negativos que o pequeno pode já estar sentindo. Por isso, não há problema algum em dizer que há certas imagens e informações que ela não está preparada para entender.

Também é preciso ficar atento ao consumo dessas informações em casa: é um hábito comum em muitas famílias deixar a televisão ligada em noticiários pesados sem que os adultos estejam, de fato, prestando atenção no conteúdo. Muitas vezes, os pais e cuidadores nem se dão conta de que as crianças estão sendo expostas a imagens violentas.

Falar sobre guerra pode abrir um espaço para abordar o outro lado: a empatia e a solidariedade nessas situações. “É bem válido para ajudar, inclusive, as crianças a desenvolverem esses sentimentos. Pergunte em que ela poderia ajudar, mesmo distante da guerra. Esse pode até ser o foco da conversa: como existem pessoas boas que se solidarizam e ajudam em diversas áreas durante um conflito, como médicos, voluntários. Explique sobre como é feita a doação de alimentos, roupas, materiais de higiene” explica a psicóloga.

Veja também: Livros sobre refugiados para apresentar às crianças.

Clube de Leitura Quindim, o melhor clube de assinatura infantil

Mudança de comportamentos 

Por último, não se deve subestimar a capacidade de absorção dos pequenos. Mesmo que não expressem verbalmente, eles podem apresentar mudanças de comportamentos, como apego excessivo, medo de distanciamentos ou até maior agressividade. Por isso, é essencial manter a rotina normal e passar ainda mais segurança a eles. A criança precisa sentir que a família está protegida — e que os pais estão cuidando para que nada de ruim aconteça.

Ainda assim, o medo pode estar presente e é preciso validá-lo. Não diga: “a guerra está distante, não vai acontecer nada aqui”.

“O medo é uma emoção e assim como todas as outras é uma emoção bem-vinda, mesmo que seja desconfortável. É uma forma de proteção. Podemos encorajar as crianças a superar e lidar com esse medo. Junto com seu filho, os pais podem encontrar alternativas: quando a criança sentir medo pode pedir um abraço ou usar uma pulseira para dar coragem, por exemplo”, diz a psicóloga materna, ressaltando que também pode ser uma oportunidade de falar sobre os medos mais palpáveis da criança.  “São algumas formas de normalizar esse sentimento.”

Veja também: Direitos da Criança: nossa sociedade está cumprindo com seus deveres?

Estante Quindim

Conheça 3 livros que abordam as consequências das guerras e que podem ajudar sua família a iniciar um diálogo com as crianças:

A guerra (escritor José Jorge Letria, ilustrador André Letria, editora Amelì)
A guerra, de José Jorge Letria e André Letria
Refugiados (escritor Ilan Brenman ilustrações Guilherme Karsten, editora Moderna)
Refugiados, de Ilan Brenman e Guilherme Karsten
Filas de sonhos
Filas de sonhos, de Rita Sineiro e Laia Domènech
Assine o Clube de Leitura Quindim