O pai chega e vai embora sem avisar, permanece pouco tempo, o suficiente para encantar o filho com as suas histórias fantásticas e aventuras pelo mar. Com o corpo repleto de tatuagens ele narra para o menino a origem dos desenhos gravados em sua pele, enredos que também ficam gravados na memória da criança. Um tigre de dois rabos que arrancou a cabeça de um marinheiro, um pássaro gigante, uma aranha que quase o devora são alguns dos perigos enfrentados por esse pai-herói.
Um pai que é um pouco como Simbad, o marujo que atravessou mares bravios, se salvou de uma baleia em forma de ilha, de um pássaro que atirava pedras e tantas outras ameaças fantásticas. Assim como Simbad, o pai também é um grande contador e encantador de histórias, sua presença se faz mesmo na ausência, pois o espaço vazio é preenchido com as histórias.
Nossa memória mistura fantasia e realidade, sonho e vida vivida. No livro de Daniel Nesquens, é o menino que narra as histórias do pai, embalado por recordações que possuem doses de realidade e imaginação. É essa mistura que aparece também nas ilustrações de Sergio Mora, que trazem desenhos com inspiração vintage, lembrando um passado cheio de cores e formas com ares de sonho. Algumas imagens mostram referências à Alice no país das maravilhas, outras ao circo, ou ao velho oeste, mostrando que as histórias que ouvimos se encontram com a nossa própria história. Nessa mistura que nos faz lembrar os sonhos, o livro emociona pela potência das narrativas embaralhadas, unidas à traços de melancolia pela ausência desse pai forte e presente, uma figura com imagens contraditórias, assim como sonho e realidade.