As belas ilustrações de Alfonso Ruano criam o ambiente de acúmulos e levezas, simpatias e sobreposições de imagens, formas novas que se formam de antigas formas, a fim de acomodar uma das últimas prosas de Bartolomeu Campos de Queirós (2009), na sequência do IV Prêmio Ibero-Americano SM de Literatura Infantil e Juvenil.
Num cenário de sonho e assombro, um menino e um velho poeta-pensador se encontram, questionando a natureza do tempo. Para quem mal acabou de perder os dentes de leite, o tempo deve ter uma existência material, braços, estômago, olhos que enxergam mas ainda não foram vistos por ele. Para quem viveu anos e anos e tornou-se uma pessoa já cansada ou uma porção pequena da vida, o tempo foi tudo o que não se alcança, é aquilo que não caminha com pés mas pisoteia os homens, a cor que desbotou, a maciez que enrijeceu, e também será a fortaleza com doçuras.
Unindo a pluralidade dos modos de elogiar, lamentar e reconhecer o tempo inexorável e bento, aqui temos o diálogo como um lugar privilegiado para trocar visões poéticas, num ir-vir-viver o pensamento em infinita linha. Afinal, o tempo nos rodeia e nos prende a todos. E, neste clima surrealista, a imagem verbal e a imagem visual conseguem encontrar contínuas equivalências: ora é a sinédoque infantil, ora é a metonímia que o homem de literatura toma-lhe de empréstimo e quer transformar em metáfora. Nada é oposto, tampouco se divide, pois o tempo multiplica significados, afetos e desejos.
O que deseja inicialmente o menino é conhecer o tempo — o tempo mesmo que o adulto desejaria esquecer, lembrando-se. Neste jogo da imaginação e da memória, o leitor não vê apenas um menino e um velho poeta porque sabe que o velho poeta é o menino.