Você, adulto cuidador, talvez lembre de um ou mais momentos na infância em que não tinha nada para fazer. Não era hora de ir para a escola, nem realizar tarefas, até mesmo as demandas de casa já haviam sossegado. Nesses momentos, o que você fazia? Espreitava insetos no quintal, rabiscava o barro com um graveto, adivinhava o formato das nuvens ou apenas olhava para o teto, quem sabe, acompanhando a dança das luzes dos carros refletidas pelo vidro da janela?
Muitos de nós tivemos essa oportunidade de viver plenamente momentos de ócio ou tédio como esses. É bem verdade que poderíamos até achar chato não ter nada para fazer, mas quantas histórias criamos, quantas situações imaginamos, quantas associações e descobertas fizemos justamente quando o nada preenchia nosso tempo e nossa mente?
Escrita em prosa poética, a crônica de Gaël Faye fala de uma infância vivida no Burundi, país da África Ocidental, numa época em que as telas não estavam facilmente disponíveis e, por esse motivo, a contemplação da vida é o que gastava as horas. As páginas são preenchidas da mais pura poesia, com muitas palavras diferentes e novas que vão enriquecer ainda mais o vocabulário do seu pequeno leitor.
As ilustrações de Hippolyte são de uma beleza absurda e bastante familiares: as cores, plantas e animais não são tão diferentes do que podemos encontrar em nosso país. A sobreposição das imagens do menino e da natureza vão se misturando para além das páginas como uma lembrança e um testemunho da riqueza de um mundo verdadeiramente experimentado por tão poucos de nós.
Este é um livro para abandonar de vez a ideia de que o tédio e o ócio são um castigo, e para dar lugar à compreensão daquilo que, de fato, oferecem: oportunidades incríveis de criar, transformar, conhecer e experimentar.