Vamos entrando no livro e vemos a sentença em letras brancas num fundo fortemente azul: meninas gostam de rosa... Ao virar a página, encontramos a personagem debruçada sobre um caderno, vestida de azul... O mais intrigante é a linha que sai da ponta do lápis da menina. Os significados são muitos: traço sobre o papel, fio que se desprende e vai estender a narrativa adiante, contorno, movimento, tudo que o que ata, margeia, desalinha. Pois a mãe de Nina gosta de rosa e a menina, não! O fio salta a figura da mulher adulta tão cheia de pacotes, caixas e laços.
Depois da terceira página acompanhamos a história marcada pelo compasso da contradição. Nina vai sendo dirigida para as aulas de balé num mundo quadrado e cor de rosa, a vida é mesmo uma barra de exercícios e movimentos repetidos, mecanicamente repetidos, para quem possui um horizonte feito uma oscilante linha azul! Todo o mundo parece correto e ordenado... pra Nina, não!
Narrado principalmente através de imagens e com o constante bordão que revela a contrariedade da personagem, o livro de Daniela Galanti mostra como os abatimentos tomam conta de nossa vida desde os primeiros passos rumo a outras pessoas e instituições, com suas formas codificadas de convenção social. A história vai assim um pouco além da questão de gênero, falando igualmente da diversidade de aptidões, gostos e pensamento. É bonito ver Nina se despindo das imposições e a linha azul indicar a liberdade de seus movimentos. Linha que saltita, linha que volteia, enrola e caraminhola sobre seus próprios interesses.