Neste conto de Júlio Verne, publicado na França em dezembro de 1884, o leitor é conduzido até a pequena cidade de Luktrop na região costeira volsiniana, entre as montanhas de Crimma e o profundo mar de Megalocride. Na vizinhança, existe um vulcão ainda ativo, expelindo rolos de enxofre durante o dia e vomitando labaredas à noite, e também ruínas e mais um subúrbio adiante com suas construções de tetos arredondados com características árabes. É uma paisagem exótica que se ajusta muito bem ao slogan — “ler é viajar”, de acordo com o gosto de escritores e leitores de séculos passados — e o ilustrador Alexandre Camanho foi criando imagens que transmitem a sensação de saírem de antigos cadernos de viajantes, ao usar a técnica do bico de pena, a tinta nanquim e manchas de cor sépia como leituras sobrepostas do tempo.
No entanto, Luktrop não é uma cidade que se encontrará em qualquer mapa, diz o autor francês, iniciando o seu jogo literário e narrativo. E numa noite daquelas, chuvosa, a filha de Vort Kartif, o salgador de peixes, bate à porta do médico do lugarejo. No entanto, este não se encontra disposto a prestar socorro, uma vez que constituiu fortuna com serviços a famílias abastadas. Tempo depois, aparece a esposa de Vort Kartif à porta, mas o médico só tem interesse em dormir agasalhado da chuvosa noite. Mais tarde, é a vez da mãe do salgador de peixes vir e dizer ter o dinheiro para pagar adiantado pelo atendimento... Mas — e as muitas histórias de medo têm uma adversativa que nos arrepia, debaixo de uma noite fria — mas, o doutor recusa, titubeia e finalmente decide caminhar em auxílio ao próximo...
Que sintomas da vulnerabilidade humana nos causariam mais pena, asco ou temor pela própria vida? A morte preeminente ou a ganância ostensiva? Atento às minuciosas sugestões morais de um conto fantástico do final do século XIX, Alexandre Camanho intensifica o texto de Júlio Verne com uma interpretação visual fabular, apresentando os principais personagens como um lobo e galinhas nas ilustrações que pontuam as passagens da narrativa.