Os pais de Sofia lhe prometem muitas coisas incríveis quando trocam a vida na cidade por um simpático vilarejo próximo à praia. Mas não cumprem sequer um dos juramentos. E o que deveria ser um mar de rosas se transforma num caos sem o menor sentido.
Enquanto seu pai trabalha o dobro de horas da vida anterior e sua mãe silencia a angústia de não trabalhar, a garota sente falta da companhia dos dois e questiona o modo de vida desde que chegaram à nova casa: “Mas agora a minha mãe não tem uma floricultura e quase não sorri; o meu pai é o Super-homem, o Supernão ou o Sr. Resmungão e nem se lembra de abraçá-la; e ‘aqui’ só existe ar puro irrespirável”.
Seu refúgio está na amizade com Fau e Frodo. Juntos, se aventuram andando de bicicleta, apostando corrida e descobrindo novos caminhos até a praia, onde sempre encontram pessoas e suas “inutilidades”. Catar gravetos diferentes, estudar as estrelas do mar, pintar a paisagem, tocar instrumentos são consideradas por seu pai coisas inúteis, não servem para ganhar a vida. A distância entre o que Sofia sente e o que seu pai consegue perceber causa desentendimentos entre os dois e torna a vida nova ainda mais tensa.
A protagonista narra tudo em forma de carta, como uma escrita para si, uma tentativa de compreensão do vivido. E quando questionada em sala de aula sobre o que gostaria de ser quando crescer, não titubeou: “quero ser inútil”. Sofia não quer desperdiçar a sua vida ganhando dinheiro para pagar o carro se isso causa tristeza. Acena para a sua mãe e para o seu pai que os três precisam ganhar a vida de vez. Dotar a existência de sentido e de emoções, e que isso perpassa por dedicar algumas horas do dia ao "não fazer nada" ou a atividades livres.
A narrativa é uma prosa com boas doses de emoção e também bom humor, acompanhado de algumas ilustrações da artista Bea Enríquez. O leitor irá se transportar para o cenário imaginado com o desejo de sentir a descida até a praia. Com o desejo de sentir frio na barriga todos os dias.