A leitura é uma experiência única, subjetiva. Por isso, um mesmo texto toca as pessoas de maneiras diferentes. E ler os escritos que Clarice Lispector destinou especialmente às crianças é algo especial. Esse livro, então, tomado de simbologias, é uma aposta certa de emoção, desde a capa.
A autora parte da culpa por ter matado acidentalmente os peixes do filho, para reunir em uma prosa, que mais se assemelha com uma conversa (ou confissões?!), as experiências que teve com diversos animais ao longo da vida. Suas lembranças enquanto ainda criança são costuradas às vivências e ocupações de uma mulher, escritora, esposa de diplomata e mãe. Clarice conserva o desejo de dialogar com o leitor ao longo de sua prosa, instigando-o a todo instante a participar da construção desse diálogo: “Diga baixinho o nome de vocês e meu coração vai ouvir”.
É nítido o apreço aos animais, nenhum deles lhes passa desapercebido, nem mesmo os que lhes foram obrigados à convivência como ratos e baratas. Clarice nos conta dos casos em que foi arrebata por encantamento instantâneo por certos bichos e de como esses encontros muitas vezes foram breves. Tem história com gato, cachorro, lagartixa, coelho e até macaco. Seu apreço por animais nos faz lembrar que a morte muitas vezes não é o fim.
As ilustrações do livro foram encomendadas a Mariana Valente, neta de Clarice. A mesma relata que foi um trabalho “muito revelador”, principalmente por tratar de temas como morte e finitude. A artista adornou o projeto gráfico do livro com colagens coloridas e em preto e branco, que remetem à passagem do tempo. Há momentos de exuberância e de pequenez nas imagens escolhidas. Há também um bailar entre a vida e o fim das coisas, entre ser e não estar.
Clarice pede perdão às crianças. E todos nós a abraçamos.