Um poema cabe em todo lugar: na pichação de um muro, na última folha de um caderno, onde quer que a palavra escrita ou falada se instale. É possível fazer cair uma construção ou arrancar uma página, depois rasgá-la, porém nada destruirá a palavra. Estas são duas ideias principais que Rosana Rios usou, numa homenagem ao poeta Manoel de Barros, para alinhavar a história do menino Tui e poder mágico que ele intui para mudar a percepção da realidade e alimentar-se dos sonhos.
Em uma cidade indeterminada faz muito calor. Na escola, Tui não tem ânimo nem para brincar no recreio, debaixo do sol, preferindo um livro de poemas do caixote de livros que ninguém mais retira para ler, apenas ele. Passando os dias com as duas sedes — água e poesia — o menino sentirá o desejo de escrever seus próprios versos e, com este recurso, tudo se tornará mais ameno.
Paralelamente ao conto de ações sucessivas, Mauricio Negro intentou ilustrar uma camada de poesia sobre os quadros do cotidiano pobre. Utilizando uma técnica mista do scanner ao desenho digital, as imagens são carregadas de contrastes mergulhados no vermelho escaldante. Destacam-se a metalinguagem do livro dentro do livro e as associações visuais, como as mãos que são as páginas de um livro de capa verde, a mesa transformada em aquário, o copo “vazio” e depois a desejada tempestade num copo d’água, as referências a alguns símbolos religiosos do candomblé, os olhos do menino que irradiam como sol e sonham o frescor da ventania.