Duas histórias, duas compreensões da vida, o livro-mural de Bruna Lubambo, em parceria com o mestre Sekuru Compound Muradzikwa, nos leva para dentro de dois contos africanos do Zimbábue. De um lado do papel dobrado em ziguezague encontraremos dois bodes muito berradores que viviam no pé de uma serra e, uma dia, decidem atravessar uma ponte; no entanto, um partia de cá, o outro vinha de lá e podemos já imaginar que bode que isso vai dar. Do outro lado do livro em formato sanfonado, acompanharemos os passos de um homem que desejava subir uma montanha e, no meio da viagem, para e passa a observar as cabras; magicamente, uma delas chega-lhe perto e diz algo muito sábio.
Diferente de muitas narrativas europeias a que acostumamos separar por gêneros literários, as histórias africanas da tradição oral ainda apresentam uma mescla saborosa. É um conto porque se conta numa língua viva, mas a presença de animais nos remete à fábula com uma moral mais filosófica, em sua simplicidade. O texto é muito sintético e a narração já nos põe de aviso: “Algo maravilhoso não é maravilhoso, e isto é fantástico. Assim tem sido...” Também há um clima de adivinha como se, a cada passo, a história parasse para fazer entrar o leitor com sua própria imaginação, conhecimento e predições. O que você acha que fizeram os bodes quando se encontraram no meio da ponte estreita?
Por sua vez, o uso das ilustrações por toda a extensão da folha dá um lugar privilegiado para o observador. A ponte atravessa uma paisagem contínua de terra, rio e céu, num só golpe de vista: não há a perspectiva clássica, mas a perspectiva afetiva que permite ver que tudo o que está embaixo, está em cima, o que vem de lá é estranhamente igual ao que daqui parte. Os bodes somos nós, ora sem capacidade de resolver os problemas, ora modestos para acatar as possibilidades com cuidado... Na outra história, um exercício da paciência: aprendemos, quando caímos, que a resposta logo vem. De baixo acima, para a montanha, pela imagem, pelas palavras, vemos e entendemos que nada pode ser uma reta nas caminhadas.