Nem sempre filho de peixe, peixinho é. Nem todo jovem índio é o primogênito, nem irá responder ao chamado dos versos do I-Juca Pirama que cantam ideias de valentia e destemor: “Sou bravo, sou forte, / Sou filho do Norte; / Meu canto de morte, / Guerreiros, ouvi.” Ora, a antiga preocupação do poeta Gonçalves Dias foi criar, para os leitores do século XIX, uma imagem fixa do indígena brasileiro, isto é, um estereótipo que fora aceito culturalmente por muitos de nós. Porém, nas últimas décadas, muitos autores buscam mostrar o outro lado das histórias que podem se desenrolar nas aldeias e nas comunidades.
Nesta breve novela, sem negar as tradições dos clãs patriarcais, os costumes e também os ritos comuns a diversos povos originários, Daniel Munduruku conta a saga do terceiro filho do cacique Nafukaká com a formosa Kabidjay que, por conta das dores, rejeita a criança no momento do parto. Franzino, o protagonista jamais poderia sonhar em assumir o papel de líder político, não só em razão de suas condições físicas, mas também pela necessidade de obedecer a uma linha sucessória entre os irmãos mais velhos. Talvez no futuro pudesse vir a ser pajé, o líder espiritual que sustenta a alma do seu povo com seus conhecimentos frente aos mistérios da vida e da natureza.
A infância transcorre dentro dessa ordem preestabelecida, o menino muitas vezes brincando afastado de amigos. A adolescência será marcada por descobertas daquilo que habitualmente chamamos destino, junto dos conselhos da avó, a desilusão do primeiro amor, a companhia da alma encantada dos animais em uma grande viagem astral. Assim, o jovem forma-se homem, afastando dúvidas e ponderando, com inteligência e afeto, sua índole e aptidões.