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O que é cultura surda? Entenda e esclareça o assunto com seus filhos, sejam eles surdos ou ouvintes

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Conhecer a cultura dos surdos – e repassar este conhecimento às crianças – é crucial para a inclusão dos surdos.

Você sabe o que é cultura surda? Essa é uma pergunta cuja resposta nem sempre é positiva, mas deveria ser, e é papel de cada um de nós conhecer e aprender mais sobre ela, já que ela tem um papel fundamental na inclusão verdadeira de surdos em todos os campos da sociedade.

De acordo com a PNAD Contínua de 2012 a 2018o Instituto Locomotiva e a Semana da Acessibilidade Surda e a OMSpelo menos uma a cada 50 crianças e um a cada 20 adultos possui comprometimento auditivo no Brasil.

Essa realidade está bem perto de nós, o que torna ainda mais importante conhecer a cultura surda, de modo que sejamos elementos ativos na inclusão de surdos e possamos instruir nossas crianças no mesmo caminho, até chegar o momento em que isso esteja intrínseco na sociedade.

Nos acompanhe na leitura para conhecer a definição de cultura surda, a história desse termo e o que precisamos saber para contribuir positivamente com as pessoas com comprometimento auditivo, sejam nossos filhos, netos, sobrinhos, amigos, conhecidos ou desconhecidos.

Cabe ressaltar que o Clube de Leitura Quindim usou como uma das referências para a produção deste conteúdo um ótimo artigo do Instituto Federal da Paraíba (IFPB), que explica muito bem sobre essa cultura tão rica e importante.

O que é cultura surda?

É o conjunto de crenças sociais, comportamentos, artes, tradições literárias, valores e instituições compartilhadas de comunidades influenciadas por comprometimentos auditivos e que recorrem à língua de sinais como principal meio de comunicação.

O fato de ter algum tipo de comprometimento auditivo, seja ele leve ou intenso, não inviabiliza que as pessoas interajam com a língua, participem ativamente da sociedade ou produzam cultura e arte, pelo contrário: abre novas formas de fazê-lo.

Assim como acontece com várias outras minorias linguísticas, as pessoas surdas desfrutam de uma cultura única e merecedora de respeito. Mas apenas nos últimos anos é que as pesquisas começaram a abordar diferentes aspectos da comunicação, sociedade e relacionamentos dos surdos.

A grande questão é que essa cultura, infelizmente, ainda é pouco conhecida, especialmente entre o grupo dos ouvintes. Porém, o ponto positivo é que ainda há tempo para se aprofundar mais neste tema, e cada um de nós tem um papel essencial para a divulgação da cultura surda.

Veja também: O que é alteridade e empatia: quais são as diferenças e como ensinar esses conceitos aos pequenos

Quando surgiu a cultura surda?

É um pouco difícil ser muito preciso aqui. Afinal de contas, o comprometimento auditivo sempre existiu na humanidade e, portanto, encontrar registros claros do início da cultura surda é uma atividade bem complicada, se é que é possível.

Ainda assim, podemos apontar para alguns marcos importantes. Um deles é a Língua de Sinais Francesa (Langue des Signes Française, ou LSF), que, de acordo com a Encyclopaedia Britannica, teve seus primórdios por volta da metade do século XVIII.

O sistema foi desenvolvido por Charles-Michel, abbé de l’Epée, educador de crianças surdas pobres, que tinha como objetivo permitir a soletração de palavras em francês por meio de um alfabeto manual e, assim, expressar conceitos completos com sinais simples.

Charles-Michel, abbé de l’Epée, 1833

A LSF derivou do trabalho de Charles-Michel, da qual inclusive veio também a Língua de Sinais Americana (American Sign Language, ou ASL). Sua história aponta para o ano de 1814, quando a primeira escola para crianças surdas foi fundada em Hartford, Connecticut.

As línguas de sinais mais usadas em todo o mundo são as seguintes, com a maioria das estimativas de falantes derivadas do Ethnologue: Languages of the World, publicação anual que é referência em estatísticas e outras informações sobre as línguas vivas de todo o mundo:

  1. Língua de Sinais Indo-Paquistanesa: 6,3 milhões (2019)
  2. Língua de Sinais Indonésia: 900 mil (2016)
  3. Língua de Sinais Russa: 715 mil (2014)
  4. Língua Brasileira de Sinais (Libras): 600 mil (2019)
  5. Língua de Sinais Espanhola: 523 mil (2017)

Em relação ao termo “cultura surda”, por sua vez, quem o cunhou foi Carl G. Groneberg, linguista surdo sueco-americano que foi um nome muito importante na Língua de Sinais Americana. Ele, inclusive, foi o primeiro a discutir as analogias entre as culturas surda e ouvinte em 1965.

Quais são os principais elementos da cultura surda?

Também de acordo com o IFPB, alguns dos principais elementos da cultura surda são os seguintes:

Leia também: Livros para falar sobre diversidade com as crianças

Veja também: O que é identidade surda? Conheça os 5 tipos de identidade surda

Exemplos de cultura surda

Depois de todos esses esclarecimentos, cabe também destacar um exemplo da cultura surda na prática, algo que a comunidade ouvinte nem sempre conhece, compartilhado pela British Deaf Association (BDA, ou Sociedade Britânica dos Surdos, em tradução livre).

Imagine, por exemplo, a forma que os surdos interagem em um restaurante. Existe um constante contato visual para se comunicar nas línguas de sinais, ao passo que os ouvintes não fazem tanto contato assim e podem continuar comendo.

A própria BDA cita um trecho do livro “Vendo vozes: Uma viagem ao mundo dos surdos” (1989), do Dr. Oliver Sacks, em que ele conta o que sentiu, como ouvinte, ao entrar em contato com a cultura surda em sua visita à Universidade Gallaudet (EUA), única no mundo com programas desenvolvidos para pessoas surdas.

Segue o trecho, em sua versão em português:

Quando estive no Gallaudet em 1986 e 1987, a experiência me surpreendeu e comoveu. Nunca antes eu vira uma comunidade inteira de surdos, nem tinha verdadeiramente a ideia (embora em teoria eu soubesse) de que a língua de sinais pudesse de fato ser uma língua completa — uma língua adequada para namorar ou fazer discurso, para o flerte ou para a matemática. Tive de assistir a aulas de filosofia e química dadas nessa língua; tive de ver o absolutamente silencioso departamento de matemática em funcionamento, ver no campus os bardos surdos, a poesia na língua de sinais e a abrangência e profundidade do Teatro Gallaudet; tive de ver a fascinante ciência social no bar dos estudantes, com mãos voando em todas as direções no decurso de uma centena de conversas distintas — tive de ver tudo isso pessoalmente antes de poder ser demovido de minha anterior “visão médica” da surdez (uma doença, uma deficiência que tinha de ser “tratada”) e adquirir uma visão “cultural” dos surdos como formadores de uma comunidade que possui língua e cultura completas e próprias.

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