PARA CRIANÇAS
Crédito: Correio Braziliense
O autor cuiabano passou a infância no Pantanal e produziu uma obra marcada pela simplicidade e referências intensas à natureza e à observação dos acontecimentos singelos da vida.
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Crédito: Marcelo Buainain (Divulgação/Itaú Cultural)
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Nos seus versos, conseguimos reencontrar o sentimento do próprio autor diante dos acontecimentos que o cercavam enquanto menino. O trabalho com as palavras nos transporta em direção à calmaria de um estilo de vida despreocupado, curioso e brincante, tão característicos da infância.
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O privilégio insetal de ser uma borboleta me atraiu. Por certo eu iria ter uma visão diferente dos homens e das coisas. Eu imaginava que o mundo visto de uma borboleta seria, com certeza, um mundo livre aos poemas. Daquele ponto de vista: Vi que as árvores são mais competentes em auroras do que os homens. Vi que as tardes são mais aproveitadas pelas garças do que pelos homens. Vi que as águas têm mais qualidade para a paz do que os homens. Vi que as andorinhas sabem mais das chuvas do que os cientistas. Poderia narrar muitas coisas ainda que pude ver do ponto de vista de uma borboleta. Ali até o meu fascínio era azul.
BORBOLETAS
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UM BEM-TE-VI
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O leve e macio raio de sol se põe no rio. Faz arrebol… Da árvore evola amarelo, do alto bem-te-vi-cartola e, de um salto pousa envergado no bebedouro a banhar seu louro pelo enramado… De arrepio, na cerca já se abriu, e seca.
BERNARDO É QUASE UMA ÁRVORE
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Bernardo é quase uma árvore Silêncio dele é tão alto que os passarinhos ouvem de longe E vêm pousar em seu ombro. Seu olho renova as tardes. Guarda num velho baú seus instrumentos de trabalho; 1 abridor de amanhecer 1 prego que farfalha 1 encolhedor de rios – e 1 esticador de horizontes. (Bernardo consegue esticar o horizonte usando trê Fios de teias de aranha. A coisa fica bem esticada.) Bernardo desregula a natureza: Seu olho aumenta o poente. (Pode um homem enriquecer a natureza com a sua Incompletude?)
Sou leso em tratagens com máquina. Tenho desapetite para inventar coisas prestáveis. Em toda a minha vida só engenhei 3 máquina Como sejam: Uma pequena manivela para pegar no sono. Um fazedor de amanhecer para usamentos de poeta E um platinado de mandioca para o fordeco de meu irmão. Cheguei de ganhar um prêmio das indústria automobilísticas pelo Platinado de Mandioca. Fui aclamado de idiota pela maioria das autoridades na entrega do prêmio. Pelo que fiquei um tanto soberbo. E a glória entronizou-se para sempre em minha existência.
O FAZEDOR DE AMANHECER
04
DEUS DISSE
05
Deus disse: Vou ajeitar a você um dom: Vou pertencer você para uma árvore. E pertenceu-me. Escuto o perfume dos rios. Sei que a voz das águas tem sotaque azul. Sei botar cílio nos silêncios. Para encontrar o azul eu uso pássaros. Só não desejo cair em sensatez. Não quero a boa razão das coisas. Quero o feitiço das palavras.
EXERCÍCIOS DE SER CRIANÇA
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No aeroporto o menino perguntou: -E se o avião tropicar num passarinho? O pai ficou torto e não respondeu. O menino perguntou de novo: -E se o avião tropicar num passarinho triste? A mãe teve ternuras e pensou: Será que os absurdos não são as maiores virtudes da poesia? Será que os despropósitos não são mais carregados de poesia do que o bom senso? Ao sair do sufoco o pai refletiu: Com certeza, a liberdade e a poesia a gente aprende com as crianças. E ficou sendo.